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Writer's pictureJess Petkow Fraser

“A falta de natureza pode estar te deixando doente”

"A falta de natureza pode estar te deixando doente" – Eu me deparei com essa frase hoje pela manhã e ela serviu perfeitamente depois de um final de semana imersa no “mato”, montanhas e novas paisagens. Agora eu já estou de volta na cidade e sentindo falta do ar, do espaço, do silêncio e dos sons da floresta. Eu tive a oportunidade de conhecer um ambiente de floresta totalmente novo, uma mistura diferente de paisagens, vegetação e animais. Cores, cheiros, formas, texturas e sons que juntos eu ainda não tinha visto. A sensação foi de deslumbramento, um “uau” seguido de um suspiro bem fundo. O sorriso ficou largo e os olhos curiosos o tempo todo. Eu me senti em casa, me habitando, presente no meu corpo. Notar um estado de presença diferente me trouxe o insight: “eu preciso viver minha vida rotineira de um jeito melhor”. Mas o que esse viver melhor significa, afinal?


O sorriso ficou largo e os olhos curiosos o tempo todo. Eu me senti em casa, me habitando, presente no meu corpo. Notar um estado de presença diferente me trouxe o insight: “eu preciso viver minha vida rotineira de um jeito melhor”.

Percebi que na minha rotina e as miudezas (que parecem gigantes) da vida contemporânea têm me carregado e ditado o ritmo do meu cotidiano. Muito pensamentos e afazeres, muitas ideias e ações, sem muita pausa, mas sem muita produtividade também. Eu que sigo num constante processo de aceitação da minha natureza, sinto falta de mim mesma quando me vejo lidando com urgências sem criar espaço para o importante. Falta de mim mesma, falta da minha natureza, falta de natureza. Voltando para frase inicial do texto, a falta de natureza pode sim estar me deixando doente. E quem sabe pode estar te deixando doente também.


Eu que sigo num constante processo de aceitação da minha natureza, sinto falta de mim mesma quando me vejo lidando com urgências sem criar espaço para o importante.

Para explorar essa falta, eu te convido para ir um pouco mais a fundo comigo. Te convido para ir além da linha imaginária que colocamos entre o “Eu” e a “Natureza”. Normalmente, o “Eu” é quem vive a vida cotidiana imersa na rotina moderna. E a “Natureza” são espaços naturais, com certa distância de centros urbanizados, onde podemos estar em contato mais direto com o verde, os sons de outros bichos e com a terra. Infelizmente, um entendimento e definição bem problemáticos, e eu vou tentar te explicar porquê. Mas, advirto: uma mente aberta e relaxada e um coração receptivo são necessários para seguir adiante nesse texto.


Nós humanos, com nossos grandes cérebros, desenvolvemos tanto nossa racionalidade e intelectualidade que estabelecemos uma visão mecanicista e fragmentada do mundo. A necessidade de entender como tudo funciona fez com que quebrássemos algo indivisível em várias pequenas partes e o entendimento das partes nos trouxe grandes avanços e uma grande sensação de poder. Reduzimos tudo em princípios de funcionamento mecânicos. Essa visão de mundo, ou paradigma, funciona muito bem se olharmos somente o aspecto material da vida. Mas a vida, logo ensina que viver não pertence somente ao mundo material. E como máquinas não têm almas, sofremos cedo (muitas vezes sem perceber) com um modo de vida racional, “desalmado” e blindado contra as partes mais sutis, porém fundamentais, da vida.


Mas a vida, logo ensina que viver não pertence somente ao mundo material. E como máquinas não têm almas, sofremos cedo (muitas vezes sem perceber) com um modo de vida racional, “desalmado” e blindado contra as partes mais sutis, porém fundamentais, da vida.

Separamos tudo, tiramos o pulsar e alma das coisas (e de nós mesmos), nos identificamos como “eu” e lá longe, no meio do mato, encontramos a Natureza. E o resultado de construir um império numa grande ilusão é uma sociedade frágil, com diversos sintomas de ansiedade, depressão, condições diversas de saúde mental, física e espiritual que nos distanciam ainda mais da completude que somos. Operamos altamente identificados com nossos pensamentos, alocando tempo e energia em tentar sobreviver e triunfar numa estrutura artificial e limitada. Assim, nos deparamos o tempo todo com uma grande parede, um grande muro, que pede uma nova revolução pacífica de derrubada.


Operamos altamente identificados com nossos pensamentos, alocando tempo e energia em tentar sobreviver e triunfar numa estrutura artificial e limitada. Assim, nos deparamos o tempo todo com uma grande parede, um grande muro, que pede uma nova revolução pacífica de derrubada.

É importante notarmos que a separação é algo oposto do natural e que a parte da material da nossa existência é somente uma esfera de ser humano. O material está inserido no todo que somos, mas não é a composição final. Como perceber as partes sutis da existência e navegar o dia-dia com a sensação de pertencimento? É preciso antes de tudo, uma pausa, um espaço para se conhecer mais intimamente, conhecer sua natureza e assim a natureza de tudo. É preciso observar com uma mente tranquila e um coração desperto a maneira com que vivemos. Conduzo meu barco ou estou sendo levado pela correnteza? Tenho um coração aberto, vivo e receptivo ou me fecho e guardo nele dores e rancores? É preciso também, olhar para mundo e entender os sinais que ele dá, os chamados por socorro, o que funciona ou não. É preciso acalmar a mente e retornar para si e para o todo.


Conduzo meu barco ou estou sendo levado pela correnteza? Tenho um coração aberto, vivo e receptivo ou me fecho e guardo nele dores e rancores?

Retornar para o todo nos permite olhar para nós mesmos e para o que e quem está em volta de uma maneira diferente. Aos poucos nos responsabilizamos mais pela nossa existência, por como os acontecimentos da vida nos impactam e pela as consequências de nossas ações e nos perguntamos: “como posso contribuir?”. O “Eu” fica um pouco menor e a Natureza não fica mais tão distante. Nos sentimos mais íntimos de nós mesmos e por entender nossas complexidades nos tornamos mais gentis com a gente e com os outros. Derrubar o muro da separação nos torna mais vivos e mais humanos. Saímos da sensação de falta e passamos a viver de uma maneira mais natural, alinhadas com nossa Natureza, com espaço para o material e o sutil.


Esse retorno é algo que pede prática e que precisa ser cultivado diariamente. Não é um lugar de chegada, é um lugar de repouso, um estado de presença. Se distraídos, adoecemos por causa de falta de Natureza. Se atentos, podemos retornar para casa, nos habitarmos e guiarmos nossos pensamentos, escolhas e vida em direção à derrubada pacífica do muro da separação. E é dessa maneira, conectados, atentos e humanos que podemos, que eu posso, viver a vida rotineira de uma maneira melhor.




Curiosidade: O que é esse tal de sutil?


Existem várias formas de explicar, experienciar e viver o sutil. Eu como não sou especialista em nada desse aspecto, vou dividir minha própria vivência humana, imperfeita e limitada para dar um possível significado ao sutil.


Além do plano material, do corpo físico, do que podemos tocar, temos também aspectos emocionais, mentais e espirituais. Tudo aquilo que não podemos tocar, ou ver mas, que diretamente influenciam nossas vidas – A qualidade dos nossos pensamentos e nossa identificação com eles, nossas emoções, nossa jornada e entendimento espiritual, nossas dores, como vivemos o sofrimento e lidamos com o vazio.


Quando não criamos espaço para nos notarmos, somos governados por padrões, dores, emoções e ideias que muitas vezes não estão alinhados com nossos valores mais elevados e que muitas vezes negligenciam o aspecto espiritual da vida. Porém, quando nos deparamos com perdas significativas, mudanças muito grandes e abruptas, o famoso “ficar sem chão” é que sentimos falta de algo que vá além de nós mesmos para lidarmos com os desafios. Ao contrário, nos vemos sem recursos e literalmente sem um chão para nos apoiarmos.


Quando não criamos espaço para nos notarmos, somos governados por padrões, dores, emoções e ideias que muitas vezes não estão alinhados com nossos valores mais elevados e que muitas vezes negligenciam o aspecto espiritual da vida.

Viver a vida de maneira automática, desconectada, tentando se encaixar nos diversos padrões e exigências contemporâneas, literalmente não temos tempo para notar, conhecer e desenvolver esses aspectos, os sutis, da nossa existência. E ao ignorarmos grande parte do que também somos, nos sentimos incompletos, vazios e distante da nossa essência pertencente e conectada. São nesses momentos de grande apego ao material, ou/e grande desconhecimento dos nossos aspectos sutis, é que nos vemos sem a esperança de um futuro próspero. E sufocados pelas dores momentâneas, sofremos.


Por isso, caminhar em direção ao todo, derrubar os muros da separação e viver de maneira mais harmônica e sustentável, pede o conhecimento da nossa natureza exterior e interior. Quando atingidos pelo insight do pertencimento, apesar de precisarmos sempre retornar para casa, sabemos que existe uma casa segura e sólida para retornamos. Todo o resto, vai seguir girando na eterna roda das mudanças.

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